quarta-feira, 30 de junho de 2010

Passeia



dos teus olhos
o passeio por
cada etapa

vislumbro teu cheiro
tua abertura de riso

(és inteiro... suave...)

tua voz embalada
por meu cheiro

arrepia recônditos
anuncia preâmbulos

toca-me...


texto Solange Mazzeto

foto: Raul Costa

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Já é tarde

rola e volteia
o pescoço desobedece
cede

golpeia o ar

penumbra
pernas rolam
bocas disparam

a seda seduz o trapo


by Solange Mazzeto

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Do ciúme


Do ciúme

(Solange Mazzeto foto e texto)



uma risca

arisca



marca a dor



frases caem

na lateral

do corpo



desponta o

nariz

arrebita a

bunda



o rouge cobre a palidez

...

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Deveras



deveras sente o arrepio

a onda vai e volta

curva-se e deita

avantajada na delícia de ser plena



desejosa graceja a fada

que de leve toca

a flauta adormecida



[instante de pureza; dorme recolhida]



e lida com a emoção

que evoca os deuses



deusa pura, menina caiada

deusa nua, mulher desejada

vontade rubra

da boca

amada

...



texto by Solange Mazzeto


IMAGEM: Solange Mazzeto

Palavras



FOTO: Solange Mazzeto


A literatura é feita com as palavras que desejam morar no corpo. Somente assim ela provoca as transformações alquímicas que deseja realizar. Rubem Alves

terça-feira, 15 de junho de 2010

Testosterona e bola

Parecia final de campeonato. Fui almoçar no shopping, e pasme tudo parado, Sampa parou. Na loja de botas, os homens loucos, olhar vazio, ou melhor, na ‘bola’. O vendedor me disse todo sorridente:

----Vamos assistir o jogo na tela do cinema, em terceira dimensão.

Nossa! eu exclamei!

E ele:

---- Se a senhora quiser, pode ver também, não é só pra nós...

Fiquei imaginando, uma bola em 3D vindo na minha direção, e também os bumbuns dos jogadores, pernas encavaladas, o suor escorrendo e tudo isso em 3 D, não curti a visão, repudiei, e me concentrei nas botas que eu estava escolhendo pra comprar.

Fiquei indecisa entre uma com costura na lateral que dava uma elegância sutil, e outra bota com uma fivela não dourada, porque agora é um tal de ter só fivela dourada nas botas, que argh... Optei pela que não tinha nada dourado, só mesmo o marrom café.

Café, hum... Nesse frio que anda fazendo, é bom não é! Só que não tomo café, prefiro chá.

Na volta pra casa, o congestionamento reinante, apavorante, eu a pé, as pessoas meio que doidas nos carros, achei um horror isso hoje, será que o povo precisa tanto assim de ‘parar o tempo’ e se empolgar tanto pra ver uma partida de futebol?
Que será do Brasil daqui a 4 anos? Quando a Copa ‘vier’ pra cá?

Bom, melhor eu não pensar, o futuro pode ser uma miragem...

O hoje foi assim pra alguns, pra mim foi dia de trabalhar, de fazer compras, de olhar nos olhos da minha cachorra e ver que ela ama uma bolinha também, aliás, ela é louca por bola... Pois bem, é isso as pessoas são loucas por uma pelada, são loucos por bolas, senti isso no ar, bola e testosterona jogada no ar, driblando talvez as dores do cotidiano, é isso aí, querendo ou não, curtindo ou não, é Copa, é Brasil jogando, e querendo um Hexa. Pois bem que vença o melhor, não é assim?!


Solange Mazzeto

sábado, 12 de junho de 2010

Noite linda




noite gélida
mas minh’alma
aquecia o frio

compostura despida
rostos amigáveis
cigarro de palha

[luz azul e música de outono]

garoa fina inundava a retina
e descortinava a dança
da alegria


TEXTO: Solange Mazzeto
DESCONHEÇO A AUTORIA DA IMAGEM

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Eu não sei



eu não sei se a cadeira é fria
mas sei que você me espia
na beirada da pia
na calçada do sol

não sei se meus passos
chegam ao ponto máximo
do teu auge

e nem se daremos mais passos

mas sei que minha alma
é una contigo

que minha fala é soberana

e que por vezes
minha vida canta
macia...

na reserva do fio
que nos une, nos liga
nos faz...
amantes


texto by Solange Mazzeto
DESCONHEÇO A AUTORIA DA IMAGEM

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Sobre sentir... ternura

“Sentimos que a criança que vemos dormindo no berço dorme também na nossa alma. E a alma fica tranqüila, como a criança. É por isso que mesmo depois de apagada a luz, ida a imagem física, vai conosco a imagem poética como uma experiência de ternura.” Rubem Alves.

Enquanto lia, me veio a mente, a imagem de um menininho que conheço e o qual eu gosto muito, como se fosse meu, e dia desses o vi sentadinho, e puxando um papo com ele eu disse:

--- Você sabe que você é muito lindo?

Ele naquela ternura imensa de criança que se sabe amada e amparada me olhou nos olhos, desviou o olharzinho, sorriu um sorriso de canto de boca, e me respondeu:

--- Eu sei!

Essa imagem dele, me ‘cura’ quando o sol se esvai por alguma nuvem escura que me emudece e me escurece a vista, e então é como um cheiro da manhã em meus pulmões...

Quando me lembro da falinha mansa, da mãozinha doce, meu coração se apruma e para de chiar.

Lembro de uma coisa que minha mãe fala até hoje, estando minha irmã mais velha já com seus 60 anos... Quando sua irmã era pequena, eu não queria que ela crescesse, queria que ficasse pequena, nisso tem piada em casa, porque essa minha irmã é a menor em estatura, mas em fé, é a maior.

É o Rubem Alves, me fala ao sangue, e também me cura de meus percalços, hoje cedinho ao lê-lo, ele me deu um remédio contra a depressão; balançar é o melhor remédio contra a depressão, providenciando já um balanço aqui no meu jardim, e quero bem rústico, porque gosto de coisas rústicas pra contrabalançar talvez com minha imensa doçura, ou pra eu aprender a ser mais áspera... Não sei ao certo, só sei que ternura é algo pleno em mim e eu gosto de ser terna, e lá vem minha mãe de novo... Você é boba, perdoa muito fácil as pessoas... Até hoje eu não sei ao certo, se perdôo fácil ou esqueço o que me fazem [quando machucam] só sei que sou assim... E gosto de assim o ser.



TEXTO:Solange Mazzeto

OS SURDO-MUDOS CANTAM

OS SURDO-MUDOS CANTAM: Aconteceu em Uberaba. Disseram-me que antes da minha fala haveria um coro de crianças surdas que cantaria o hino nacional. Desacreditei. Crianças surdas não cantam. Aí entraram as crianças no palco. Um menininho de não mais que quatro anos de idade olhava espantado para aquele mundaréo de pessoas, todo mundo olhando para ele! Entrou a regente e fez-se silêncio. Silêncio para nós porque para os surdos é sempre silêncio. Iniciou-se o hino nacional. Os acordes introdutórios. A regente levantou os braços... e eles cantaram o hino nacional com gestos! Cantaram com as mãos, os braços, os olhos, o rosto, o corpo inteiro! A voz calada, o corpo cantando! Ouvimos a música que mora no silêncio. Terminado o hino todas as crianças se abriram num enorme sorriso e correram a abraçar a regente. E aí, cantaram para mim a “Serra da Boa Esperança”. Por vezes não é possível não chorar...


TEXTO: Rubem Alves